No final de abril de 2024, o Rio Grande do Sul foi severamente afetado por enchentes devastadoras
No final de abril de 2024, o Rio Grande do Sul foi severamente afetado por enchentes devastadoras, causando destruição em várias regiões do estado. Chuvas intensas e contínuas resultaram no transbordamento de rios, deslizamentos de terra e alagamentos em diversas cidades, deixando milhares de pessoas desabrigadas e causando danos inestimáveis à infraestrutura local.
Desde o dia 30 de abril, a população gaúcha tem vivido um verdadeiro pesadelo. Chuvas intensas e contínuas resultaram em enchentes sem precedentes que afetaram quase todo o estado, levando milhares de pessoas a abrigos improvisados, casas de parentes ou até mesmo às ruas. De acordo com a Defesa Civil do Rio Grande do Sul, o número de mortos chegou a 165, o de desaparecidos a 64 e 581 mil pessoas encontram-se desalojadas, das quais, 55 mil estão em abrigos improvisados. Os dados mostram que 469 municípios sofreram algum dano, afetando mais de 2,3 milhões de pessoas (dados atualizados em 25/05).
No dia 9 de maio, o Governo Federal anunciou um pacote de ajuda ao Rio Grande do Sul equivalente a R$ 50 bilhões, composto por verbas federais, anuência de impostos, renegociação da dívida do estado e linhas de crédito dadas por bancos privados. O estado gaúcho estimou os trabalhos de reconstrução em pelo menos R$ 19 bilhões.
Diante dessa calamidade, a solidariedade dos brasileiros se destacou de forma notável. Organizações não governamentais, empresas e indivíduos de todo o País se mobilizaram rapidamente para oferecer ajuda aos afetados. Campanhas de arrecadação de alimentos, roupas, água potável e produtos de higiene foram lançadas em diversas regiões, com pontos de coleta em supermercados, escolas, igrejas e prefeituras. Além disso, vaquinhas online foram iniciadas por várias personalidades públicas para despertar a cooperação através da internet, chegando a mobilizar fronteiras internacionais.
Na mesma semana que as chuvas iniciaram seus estragos no Rio Grande do Sul, a cidade de Chapecó começou uma mobilização humanitária em prol do estado vizinho. A campanha SOS RS iniciou no dia 2 de maio, tendo o Centro de Cultura e Eventos Plínio Arlindo De Nes como sede oficial das doações, e em apenas 48h já havia arrecadado 130 toneladas de produtos. Água potável, materiais higiênicos e de limpeza, medicamentos, alimentos, roupas, calçados e cobertores foram os focos principais. A cidade inteira se engajou. Por mais de duas semanas, centenas de voluntários separaram e organizaram os mantimentos arrecadados no município, enquanto representantes da Associação dos Farmacêuticos de Chapecó e Região, acadêmicos das universidades e profissionais da Secretaria Municipal de Saúde colaboraram na triagem dos medicamentos. "Iniciamos fazendo uma contagem geral de todos os medicamentos que vêm sendo doados e fazemos uma separação da validade, separando por caixas conforme a expiração", explicou uma das voluntárias, Thaise Nunes, aluna de Farmácia da Unochapecó.
A comunidade chapecoense mostrou solidariedade e empatia frente a momentos difíceis, unindo esforços para auxiliar aqueles que mais necessitam. Muitas empresas destinaram parte de seus estoques para a campanha, enquanto outras ofereceram transporte gratuito para levar os donativos até os pontos de coleta centralizados. Eventos que estavam marcados para maio tiveram parte de seus lucros revertidos para ajudar o Rio Grande do Sul e recolher doações. Empresários locais também cederam aeronaves, caminhões e carretas para os comboios que levaram as arrecadações às cidades atingidas pelas enchentes.
No dia 10 de maio, a campanha SOS RS havia destinado 800 toneladas de donativos aos municípios atingidos pelas cheias, em 51 caminhões e carretas e oito aeronaves. Os relatos emocionados de moradores do Rio Grande do Sul sobre a chegada das doações de Chapecó destacaram a importância dessa ajuda. Para muitas famílias, essas doações significaram a diferença entre a fome e a subsistência, entre o desespero e a esperança.
As chuvas que atingiram o Rio Grande do Sul provocaram danos e alterações no tráfego nas rodovias estaduais gaúchas. Até o dia 25 de maio, eram 75 trechos totais e parciais em 43 rodovias, entre estradas, pontes e balsas. Por isso, portos e aeroportos formaram corredores de transporte fundamentais nesse momento, trazendo socorro e garantindo o abastecimento das regiões atingidas.
Atualizações diárias sobre as arrecadações eram postadas nas redes sociais oficiais da Prefeitura de Chapecó e, a partir do dia 13 de maio, os recursos e materiais pedidos para doações mudaram. Ao invés de roupas, calçados e medicamentos, foram solicitadas pás, enxadas, botas e materiais de limpeza. O motivo era destinar uma força tarefa com a estrutura de máquinas do município para a cidade de Arroio do Meio, no Vale do Rio Taquari, interior do Rio Grande do Sul. Com cerca de 22 mil habitantes, Arroio do Meio teve 90% da sua extensão atingida, mais da metade de sua população desalojada e mais de 350 desabrigados.
Entre eles Cleberson Weiss Gerhardt, de 40 anos, que trabalha como terceirizado da Corsan, empresa que atua no fornecimento de água para a maioria dos municípios gaúchos. Na cheia passada, em setembro, ele chegou a atuar no resgate de mais de 68 pessoas. Desta vez, teve que priorizar a família. “Aqui subiu quatro metros e da minha casa só sobrou a escada e a laje. Não consegui ajudar os demais no resgate, pois tinha que salvar minha família, a esposa, três filhos e minha mãe, que levei para Montenegro. Sou novo e vamos tentar reconstruir com as próprias pernas. Mas não vai ser fácil. Se tivermos uma ajuda, será bem-vinda, pois aqui está feio”, relatou Cleberson.
Através da lei 8.703, que autoriza o Poder Executivo a realizar ações de auxílio a municípios brasileiros afetados por catástrofe natural, por meio de ajuda mútua, Chapecó adotou a cidade gaúcha para ajudar na sua limpeza e reconstrução. “Com essa lei nós temos o amparo legal para realizarmos uma segunda etapa de ajuda aos atingidos pelas cheias no Rio Grande do Sul. Vamos levar cerca de 10 caminhões-caçamba, dois caminhões-pipa, quatro retroescavadeiras, duas escavadeiras hidráulicas e rolo compactador, para ajudar na reconstrução das estradas e limpar ruas.
Também vamos levar voluntários entre servidores municipais e acionar voluntários das entidades para montar um exército que vai prestar outros auxílios”, disse o prefeito de Chapecó, João Rodrigues, em reunião de secretariado, diretores e gerentes, realizada na manhã do dia 13, no auditório da Prefeitura.
A primeira equipe saiu de Chapecó no dia 20 de maio, para organizar os trabalhos e mantimentos. Na sequência, a segunda equipe se deslocou a Arroio do Meio com caminhões com donativos, operadores de máquinas e voluntários da Prefeitura, entidades e clubes de serviço, somando cerca de 200 pessoas. “Quem vai para Arroio do Meio tem muita garra, vontade e amor pelo trabalho e atividades que irão desempenhar. É uma missão humanitária para ajudar e marcar a história da cidade gaúcha.
Os moradores de Arroio do Meio nos aguardam com muita ansiedade, pois vamos contribuir muito na reorganização da cidade. Isso só é possível porque temos o apoio e contribuição de toda sociedade chapecoense”, afirmou João Rodrigues, na ocasião.
O trabalho dos voluntários foi dividido em quatro frentes: uma delas para o ‘bota fora’ de móveis, outra para a limpeza de três avenidas e retirada dos entulhos depositados nas ruas, outra equipe com quatro caminhões-pipa fez a lavação das ruas onde foram retirados os entulhos e uma outra frente composta de equipes de oito a 10 pessoas para fazer a retirada do barro e limpeza das casas. A primeira-dama, Fabiana Matte Rodrigues, também fez parte da comitiva, auxiliando no atendimento dos pequenos animais, juntamente com a equipe do Núcleo de Atenção aos Pequenos Animais – NAPA. “O pessoal passa e agradece o nosso trabalho, das máquinas e dos voluntários. É muito emocionante poder ajudar”, destacou Mauri Antônio Collin, servidor público de Chapecó e que atuou como voluntário em Arroio do Meio. Ele conta que quando chegaram ao município, a lama estava tomando conta de todas as ruas, mas que com muito trabalho e dedicação, a cidade iniciou uma nova etapa.
“Centenas de cargas de lodo, utensílios domésticos e móveis estragados foram retiradas de Arroio do Meio. As equipes de voluntários de Chapecó limparam três avenidas e suas transversais. O trabalho seguiu por uma semana”, informou o coordenador da Defesa Civil de Chapecó, Luciano Hüning.
O empresário Diego Simonetti estava com sua casa e empresa cercados de escombros e em um vídeo publicado nas redes sociais da Prefeitura de Chapecó, agradeceu a cooperação catarinense, essencial para devolver a esperança aos moradores. "Quero registrar meu agradecimento aos chapecoenses, que se disponibilizaram a nos ajudar. Não se imaginava que era tão catastrófico e tão feio, mas aos poucos vamos chegar lá. São 20 anos de empresa e a casa dos meus sonhos e agora teremos que recomeçar, mas vamos recomeçar", afirmou, com convicção.
O prefeito de Arroio do Meio, Danilo Bruxel, agradeceu todo o apoio enviado por Chapecó e os moradores locais aplaudiram a saída da comitiva, no dia 26 de maio, gratos à solidariedade do Oeste catarinense. "Nós viemos juntos e estamos indo juntos. Num curto espaço de tempo, fizemos bastante. Trouxemos não somente equipamentos e trabalho, mas também apoio e solidariedade para aumentar a autoestima do povo que mora em Arroio do Meio.
Nós demos o nosso melhor, que foi o respeito, o trabalho e a acolhida. Aqui agora é a nossa segunda cidade e vamos voltar para visitar vocês. E quando puderem, nos visitem em Chapecó", disse o prefeito João Rodrigues.
Embora a resposta inicial tenha sido significativa, as autoridades e organizações de ajuda humanitária enfatizam a necessidade de um suporte contínuo. A reconstrução das áreas afetadas exigirá esforços prolongados e sustentados, tanto em termos de recursos financeiros quanto de voluntariado.
A tragédia no Rio Grande do Sul serviu como um triste lembrete das vulnerabilidades às quais estamos expostos, mas também destacou a capacidade incrível das pessoas em se unir e apoiar umas às outras em momentos de necessidade. Em tempos de crise, a união e a disposição para ajudar o próximo mostram a força das comunidades e a importância da cooperação interestadual. Este episódio reforça que, diante de catástrofes naturais, a solidariedade humana é uma das armas mais poderosas para a recuperação e a reconstrução.
Carol Bonamigo
Jornalista, especialista em Cinema e Realização Audiovisual, Diretora de Jornalismo e sócia da revista Flash Vip