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25/10/2022 saúde

Para além do câncer de mama

Outubro Rosa sensibiliza sobre a prevenção de tumores e também cuidado integral da saúde feminina

Ninguém espera um diagnóstico de câncer. Na maioria das vezes, a primeira coisa que vem à cabeça no momento da descoberta é o medo de não resistir. Com exceção da região Norte do Brasil, a primeira causa de morte por câncer na população feminina é o de mama, segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA). Em 2020, o número de óbitos no Brasil chegou a 18 mil, sendo 207 homens e 17.825 mulheres. A estimativa de novos casos para 2022 é de 66 mil, valor que corresponde a 61,61 cada 100 mil mulheres. 

O diagnóstico precoce do câncer de mama é fundamental para aumentar a possibilidade de tratamentos menos agressivos e com taxas de sucesso satisfatórias. Em grande parte dos casos, ele pode ser detectado em fases iniciais, através do autoexame de toque de mamas. Foi assim que a chapecoense Janaina Carleti, de 38 anos, descobriu que tinha um nódulo na mama esquerda. Ela atua como educadora física em uma academia da cidade há oito anos e no mês de agosto do ano passado, enquanto tomava banho, fazia o autoexame e sentiu um ‘carocinho’. Por já ter o hábito de se tocar como prevenção, sentiu o alerta de que algo estava diferente em seu corpo. Ela já tinha o preventivo marcado na Rede Feminina de Combate ao Câncer de Mama de Chapecó, então esperou a data para verificar. Ao ser examinada, por não ter casos da doença na família e não ter a idade recomendada para a realização da mamografia, a encaminharam para fazer um ultrassom. 

A ultrassonografia diagnosticou um nódulo benigno, de quatro centímetros. “Não conseguia parar de chorar de desespero, já perdi amigas por conta do câncer de mama. Foi um baque para a minha família também, a mãe ficou muito preocupada. Jamais imaginaria que iria passar pelo tratamento do câncer de mama, porque faço atividade física, tenho uma alimentação saudável, não fumo, bebo socialmente, amamentei por mais de um ano e não tenho casos na família”, relembra Jana, citando vários dos hábitos recomendados pelos especialistas para evitar esse tipo de tumor.  

A partir daí, a orientação foi de que fizesse um novo ultrassom a cada seis meses para acompanhamento do nódulo, mas que caso sentisse algo diferente durante esse período, deveria procurar novamente atendimento. Em novembro do mesmo ano, começou a sentir dores e percebeu que o nódulo tinha crescido. Após novas consultas, foi atendida por uma mastologista, que solicitou um novo exame de imagem. Desta vez, já não se sabia mais se o nódulo era benigno ou maligno, e tinha sete centímetros. Em maio de 2022, iniciou o tratamento com quimioterapia. Sua última sessão foi realizada neste mês de outubro. “Quinze dias após o início do tratamento, os fios de cabelo começaram a cair, foi um choque para mim. Um dia estava tomando banho com minha filha e ela viu meu cabelo caindo e entrou em desespero comigo. Me ver careca e ter que raspar a cabeça foi o pior”, desabafa. 



Jana  compartilhou sua experiência com o câncer de mama durante conversa com mulheres que frequentam a academia onde trabalha, no dia 18 de outubro.


Jana conta que, em decorrência da quimioterapia, teve enjoos, não conseguia se alimentar bem e que passou por dias em que não tinha forças para levantar da cama. Durante o tratamento, nos momentos em que estava menos cansada, decidiu continuar trabalhando. “Foi o que me ajudou até agora. Recebi muitas mensagens da família, de pessoas que nem moram aqui, apoio dos meus alunos, da minha filha de 10 anos, que está sempre muito preocupada comigo. Chorei muitas vezes, tem momentos que dá vontade de desistir. Não vejo a hora de terminar o tratamento, poder fazer o que eu fazia antes. A quimioterapia foi o mais pesado, mas ainda tenho uma luta pela frente”, expressa. A cirurgia para a retirada do nódulo está prevista para o próximo mês de novembro.


A prevenção é o melhor caminho

A idade é um dos mais importantes fatores de risco para o câncer de mama. Cerca de quatro em cada cinco casos ocorrem após os 50 anos, segundo o INCA. Entretanto, como aponta a médica mastologista Liana Winkelmann, fatores ambientais e comportamentais, da história reprodutiva, hormonal e genética também podem estar relacionados com as causas. “Os estudos relacionam a alta dos números ao estilo de vida adotado pelas mulheres, principalmente nas últimas décadas. A mulher foi obrigada a dar conta de tudo de uma hora para a outra, e com isso vem a mudança da rotina com má alimentação, praticam cada vez menos exercícios físicos, não dormem direito, há o abuso de álcool e tabagismo, até mesmo a primeira gestação foi empurrada alguns anos adiante para focar na carreira. Ter o primeiro filho depois dos 30 anos ou não amamentar – muitas mulheres até mesmo optam por não ter filhos – acaba aumentando o fator de risco para o desenvolvimento do câncer de mama. O uso de anticoncepcional por mais de 10 anos também pode aumentar as possibilidades e tem impacto na mortalidade”, explica a mastologista.

A profissional reforça a importância da realização de exames para além do autotoque, visto que as chances de sucesso do tratamento estão diretamente ligadas ao momento do diagnóstico. Se o tumor for identificado precocemente, em fase ainda não palpável, que é detectado através da mamografia, a chance de cura é maior que 45%. “É necessário fazer mamografia pelo menos uma vez ao ano a partir dos 40 anos, é a principal prevenção em relação à mortalidade. As mais jovens são examinadas anualmente por um ginecologista no momento da coleta do exame preventivo”, afirma Liana, que reforça que os cuidados com o peso para mulheres na menopausa são importantes, uma vez que os hormônios passam a ser produzidos na gordura corporal. “Isso pode provocar câncer de mama em mulheres em sobrepeso e obesidade. Por isso, muitos casos podem ser prevenidos com dieta adequada e exercício físico”.

Hoje, com um software de computador, é possível também reunir os dados de fatores de risco, níveis hormonais e histórico familiar da mulher para calcular o risco de suscetibilidade de desenvolver algum tipo de câncer de mama e fazer o rastreamento adequado.

A Rede Feminina de Combate ao Câncer de Chapecó é uma entidade filantrópica que desde 1982 oferece exames ginecológicos gratuitos de diagnóstico do câncer do colo uterino e de mama, e tratamento adequado quando necessário. Somente em 2021, a Rede Feminina coletou quase 9 mil exames preventivos, mais de 8 mil exames clínicos de mamas e quase 400 encaminhamentos de mamografia. O Grupo Provin (Programa Viver Melhor), aliado à RFCC, também presta apoio a mulheres mastectomizadas. Ele atende atualmente 40 mulheres que sofreram remoção da mama, oferecendo-lhes profissionais de apoio que atuam através de palestras educativas, terapias, e acompanhamento psicológico e médico.

Felizmente, Janaina não vai precisar retirar toda a mama, e a mastologista lhe disse que reagiu muito bem ao processo. Após o procedimento, ainda terá que fazer 25 sessões de radioterapia e demais procedimentos. Hoje, a educadora física incentiva outras pessoas a conhecerem seu corpo para saberem quando algo está anormal, e a procurarem ajuda. “Não tenham medo de se tocar, se olhem no espelho e, se sentirem algo diferente, vão atrás, façam a consulta, isso pode salvar a sua vida. Quanto antes se descobre, maior a chance de cura!” 


Reconstrução da autoestima

Nas fases iniciais do câncer de mama, a conduta habitual é a cirurgia, que pode ser conversadora, com a retirada apenas do tumor, ou mastectomia – retirada parcial ou total de uma ou ambas as mamas. O procedimento afeta profundamente a autoestima da pessoa, visto que mudanças ocorrem em uma de suas partes íntimas, diretamente ligada à feminilidade. 

Algumas mulheres enxergam na cirurgia de reconstrução mamária uma forma de se sentir bem com o corpo, melhorar a autoestima e qualidade de vida após a retirada da mama, mas outras preferem evitar novas cirurgias após a doença. O cirurgião-plástico Rafael Tirapelle explica que a decisão precisa ser feita com segurança e em conjunto com o profissional, que vai analisar a indicação do procedimento e a técnica apropriada para cada caso. “Na técnica de reconstrução da mama, considera-se a forma, a aparência e o tamanho após a mastectomia. A cirurgia plástica pode ser realizada ao mesmo tempo que a retirada da mama ou adiada até que a pessoa se recupere da mastectomia e de quaisquer tratamentos adicionais do câncer. Dentre as técnicas, estão os retalhos com músculo, gordura e pele da paciente para criar ou cobrir o local da mama; expansão da pele saudável para dar cobertura a um implante mamário; cirurgia de colocação do implante mamário; enxertos e demais técnicas especializadas para criar o mamilo e a aréola”, cita Tirapelle e acrescenta: “A avaliação de um cirurgião-plástico com experiência é imprescindível na orientação da melhor técnica, que deve se dar de forma individualizada para cada paciente”. 


Os cuidados precisam ir além  

Ao tratar sobre saúde da mulher, os cuidados devem se estender à saúde bucal. Silvio Gallon, cirurgião e traumatologista bucomaxilofacial, lembra que casos de bruxismo (apertar ou ranger dos dentes) e de DTM (disfunção temporomandibular), são mais diagnosticados em mulheres do que em homens. “As causas dessa maior vulnerabilidade, além das variações hormonais, também são comportamentais – como o acúmulo de responsabilidades, que pode levar à tensões e rigidez na musculatura da face e estruturas próximas. Já as variações hormonais provocadas pela menstruação, gravidez e menopausa impactam, principalmente, a saúde da gengiva”, explica o profissional.

A cirurgiã-dentista, especialista em próteses e implantes dentários, Iara Gallon, complementa a fala de Silvio, explicando as mudanças que ocorrem nestas principais fases da vida da mulher e que acabam propiciando o desenvolvimento de problemas bucais. “Durante a gestação, é comum que ela apresente redução do fluxo salivar associada a alterações no Ph e possível surgimento de cáries e doenças do tecido periodontal. Já na menopausa, pode ter a sensação de boca seca associada a hipossalivação, ardência, halitose, rouquidão, dificuldades para engolir, fissura e ulcerações nos lábios e alteração no paladar. Por isso, além de ter os cuidados bucais diários, também é importante manter consultas regulares com o dentista, para preservar a saúde bucal”, reitera.

As condições laborais também impactam diretamente na saúde feminina, com a inserção das mulheres no mercado de trabalho marcada, historicamente, por extensas jornadas e situações degradantes. De acordo com o médico clínico geral Sérgio Tansini, além das condições trabalhistas, fatores sociais, hormonais, emocionais e biológicos contribuem para o desenvolvimento de problemas ocupacionais, como as Lesões por Esforços Repetitivos (LER), estresse, depressão, Síndrome de Burnout, hipertensão arterial e os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort). “A utilização excessiva de determinados grupos musculares em movimentos repetitivos e a permanência de segmentos do corpo em determinadas posições por tempo prolongado podem levar a sobrecarga e desenvolvimento destes distúrbios”. O profissional cita como fatores de risco o excesso de horas trabalhadas e a ausência de pausas; a obrigação de manter ritmo acelerado de trabalho; mobiliário e equipamentos inadequados aos padrões ergonômicos; e condições ambientais impróprias, como má iluminação, temperatura inadequada, ruídos e vibrações. Tansini reforça que a prevenção é o melhor caminho para preservar a saúde: “Empregadores precisam oferecer espaço e condições laborais adequados aos empregados, contando com o apoio de profissionais que identifiquem os riscos ocupacionais e os orientem em relação aos cuidados ergonômicos e utilização dos equipamentos de proteção individual. Os colaboradores também precisam estar cientes da postura correta para sua determinada função e utilizar corretamente os EPIs”. 

E tratando do contexto de trabalho, no quesito financeiro as mulheres ainda enfrentam entraves, a exemplo da desigualdade salarial em relação aos homens. Por outro lado, a participação feminina no mercado de capitais deu um salto nos últimos anos, elas estão investindo mais. Como aponta o contador Paulo Vezzaro, é essencial que as mulheres sejam independentes financeiramente, porque isso impacta não só economicamente, mas na vida delas como um todo. “Mulheres não precisam e não devem ser reféns de terceiros para pagarem suas contas e desfrutarem da vida. A dependência financeira acaba, muitas vezes, colocando-as em situação de vulnerabilidade. Em condições de violência doméstica, por exemplo, a falta de dinheiro as obriga a permanecer em relacionamentos abusivos”. O profissional levanta a importância da educação financeira para prevenir dívidas e manter o equilíbrio monetário. “Colocar no papel detalhadamente os ganhos, despesas, economias e controlá-los é essencial para planejar os investimentos, alçar objetivos a longo prazo e tornar os sonhos realidade”, finaliza.

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Revista Flash Vip, contando histórias desde 2003.
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