Exposição em Chapecó traz reflexão sobre a influência da passagem precoce pelo ensino da arte
Quando crianças, explorar cada detalhe à sua volta é uma aventura sem limites. Do giz de cera surgem os monstros mais aterrorizantes; vestir um lençol pode transformar qualquer personagem; explorar o jardim pode te apresentar mundos complexos. Tudo isso, por mais simples que pareça, é nosso primeiro contato com a expressão, criatividade e a cultura que estamos inseridos. São esses primeiros contatos ao desenhar, a atuar, explorar e outras brincadeiras de infância, que moldam quem vamos ser quando adultos, independente se as futuras profissões tenham ou não relação com essas práticas.
Entre uma das manifestações mais antigas da comunicação humana, a arte é um meio de discurso que nos conecta à história e cultura de cada sociedade. Esta é uma forma dos seres humanos expressarem suas emoções, sensações e subjetividades. Presente em diversas áreas da cultura, seja através da dança, cinema, pintura, poesia, literatura e outras formas de expressão, a arte está presente em nossas vidas desde cedo no cotidiano.
Para maior desenvolvimento da arte na infância, há a presença de escolas e cursos inteiramente focados na área, para além de matérias de artes no ensino básico. Em Chapecó, em 1979 foi criada a Escola de Artes para formar o público infanto-juvenil até a fase adulta. Com os cursos de violão, acordeon, piano, ballet e desenho no início de sua história, segundo o coordenador da área de Artes Visuais da escola, Sidimar Geremia, o espaço é uma importante passagem de diversos artistas do município. Atualmente, a instituição cresceu tanto em espaço físico quanto abrangência dos cursos, são 25 nas áreas de artes cênicas, artes visuais e música, dos três anos até qualquer idade.
Ao pensar sobre a importância dos aprendizados na vida de quem passa pela escola desde cedo, há mais de 10 anos é desenvolvida a exposição “O Desenho depois do Desenho”, realizada pela área de Artes Visuais da instituição, pelo coordenador e professor há 18 anos da escola, Sidimar. O objetivo é trazer obras de ex-alunos dos cursos de Desenho e Pintura para mostrar qual o caminho que seguiram profissionalmente, para valorizar seus trabalhos e apresentar diversas perspectivas futuras aos estudantes atuais. Mais uma edição está em execução no espaço físico da escola, inaugurada no dia 5 de maio até 20 de junho. A mostra conta com profissionais de diferentes áreas e atuais professores da escola, todos que estudaram no curso em algum momento. Entre as pessoas convidadas estão: Bruna Nátali da Rosa, Carmem Leticia Castelani, Cezar Zanin, Daniel Zonta, Edgar de Souza e Kairo Madah.
O contato com a arte na escola começou desde os nove anos na vida de Bruna Natali da Rosa, formada em Artes Visuais pela Unochapecó. Na infância, a prática do desenho era constante, tanto que foram seus pais que a incentivaram a desenvolver essa área e a matricularam no espaço. Foram nove anos como estudante nos cursos na área da arte visual até concluir a disciplina de desenho, aos 17 anos. Este contato a motivou a continuar na área visual na graduação, passar pela experiência de professora de Artes pelo Estado e, por processo seletivo em 2021, se tornar professora da Escola de Artes nas matérias de Desenho e História da Arte.
Crescer em um ambiente diverso em linguagens e individualidades foi essencial para o desenvolvimento da visão de mundo que Bruna tem atualmente. “Você está em conexão com tudo, consegue fazer paralelos com todas as áreas e, mesmo que sejam diferentes, ainda assim o lugar social tem em comum o interesse na arte. Percebo isso também dando aula, esse contato mostra as diferenças de olhares, a subjetividade da proposta do artista para quem consome, e me deixou mais alerta perceber os detalhes do cotidiano, as cores, as formas, a beleza de cada coisa”, argumenta.
Já para Edgar de Souza, mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade Meridional de Passo Fundo, a arte foi presente na infância pela influência de uma de suas irmãs mais velhas, que cursava a disciplina de Gráfico e Plástica na Escola de Artes. A partir dos sete anos, o arquiteto entrou na instituição e ficou até os 15 anos, quando concluiu o curso de desenho. Atualmente, além de fazer assistências técnicas particulares de forma autônoma, sua principal função é ser professor da Unidade Central de Educação Faem Faculdade (Uceff), no curso de Arquitetura e Urbanismo.
A área criativa foi o maior interesse para Edgar, principalmente ao treinar a visão tanto enquanto estudante quanto ao trabalhar com seus alunos. “A arte foi importante para treinar a visualização de soluções para problemas, principalmente na percepção social. A arte nos torna cidadãos, para que estejamos preparados para propor soluções com menos recursos e fazer trocas com diferentes áreas, porque a escola foi um espaço que você não ficava focado só nos seus cursos, mas estava junto de diversas perspectivas”, descreve.
Como um espaço público da Prefeitura, pela Fundação Cultural, o local tem um importante papel no contato com a comunidade. Para os estudantes com dificuldades financeiras, há a possibilidade do acesso a bolsas de estudos, até 100% sem pagar pelos materiais. Além disso, o espaço é aberto para a comunidade, com exposição de obras dos estudantes e professores, gibiteca com mais de 12.000 gibis para a leitura gratuita e eventos como recitais de música, apresentações de dança e a Maratona Fotográfica para Chapecó e região.
Inserção social é um dos principais pontos que a escola trouxe para a vida do arquiteto Edgar. “Na minha família, sempre ficou claro que teríamos que passar por universidades públicas, porque a maioria dos cursos que eram ofertados na região eram privados. A escola foi um meio de acessar alguns espaços que a minha classe social não poderia, tive ajuda das bolsas do início ao fim, foi muito importante, principalmente pela interação com diferentes classes ser mais horizontal na escola, importante para qualquer profissional”, reforça.
A caminho das salas, nas paredes estão as obras da exposição “O desenho depois do desenho”. Enquanto os visitantes observam as obras, estes podem visitar a gibiteca escutando a música de outras salas de aula. É nesse ambiente que as exposições são feitas, para que a arte esteja no caminho cotidiano. “A escola é a base inicial, que vai despertar o aluno para as possibilidades, e esse projeto traz isso. As obras dos professores e egressos foram espalhadas e misturadas para mostrar a diversidade, tudo para enfatizar a formação inicial do desenho e como quem ainda está no curso pode trabalhar em áreas que conectem a expressão com o ganho de vida”, finaliza Sidimar.
Estar de volta com seu trabalho exposto e acolhido é gratificante para Bruna, um momento que revela seu crescimento e caminho percorrido na arte. “Quando você está ensinando, ao lado de colegas que foram seus professores, parece que percorri um caminho mais longo do que foi, porque a gente sempre quer fazer muita coisa, alcançar, ver, dá uma sensação que você conseguiu agregar tudo que eles tentaram te encaminhar”, conta.
A responsabilidade se faz muito presente na carreira de Edgar, principalmente ao ter suas obras expostas em um espaço que esteve presente durante o seu crescimento e amadurecimento. “Sinto muita felicidade ao expor em um lugar que professores e artistas renomados passaram, de ser parabenizado e visto por pessoas que admiro tanto, foi muito gratificante, porque quando eu visitava museus e edificações, sempre lembrava do espaço da escola e das professoras, a escola foi uma segunda casa para mim”
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